Gato Pintado, um Modernista

Por André Santana


“Café com pão

Café com pão

Café com pão

Virge Maria que foi isto maquinista?

 

Agora sim

Café com pão

Agora sim

Voa, fumaça

Corre, cerca

Ai seu foguista

Bota fogo

Na fornalha

Que eu preciso

Muita força

Muita força

Muita força”


Os amantes da boa literatura (e da ruim também) devem se lembrar de quem os introduziu ao mundo das letras. Eu, este pequeno e cabeçudo jornalista de 37 anos, posso revelar aqui que quem me apresentou a boa poesia era um gato! E não, não estou revelando um amor pueril por um professor de garbo e elegância. Ele era um gato, literalmente!

Bom, não literalmente. Na verdade, ele era um gato de espuma. Explico. Quem me apresentou a boa poesia foi Gato Pintado, o simpático e culto guardão da biblioteca do Castelo Rá-Tim-Bum. Sim, falo daquele programa produzido pela TV Cultura no início da década de 1990, e que marcou gerações (a minha, inclusive) ao narrar as aventuras do aprendiz de feiticeiro Nino (Cássio Scapin), que vivia num castelo encantado no meio da cidade grande.

Amante da boa literatura, Gato Pintado escolheu a biblioteca do Castelo para viver. E que biblioteca! O ambiente não tinha prateleiras, apenas livros, livros e mais livros. Eram exatamente 1005 exemplares, como o Gato Pintado gostava de exaltar. Ali, preciosidades da literatura mundial conviviam com o belo livro de poesias que o bichano estava sempre a ler.

Foi por meio do livro de poesias do Gato Pintado que boa parte das crianças da minha geração conheceu clássicos da literatura nacional. O Gato lia Trem de Ferro, de Manuel Bandeira (o poema que abre este texto) com uma genial entonação. Aliás, mérito da criação de Fernando Gomes, um dos mais geniais bonequeiros do Brasil. É Gomes quem dá vida a vários dos mais famosos bonecos dos programas infantis, como o X do X-Tudo, ou o Júlio do Cocoricó.

Na voz do Gato Pintado, a poesia ganhava vida. E, enquanto o Gato lia, um desenho animado passava pela tela, ilustrando o texto gracioso. Por isso, a minha geração que cresceu diante do Castelo Rá-Tim-Bum há de saber recitar todos os poemas animados do Castelo de cor.

Gato Pintado era um Modernista! Além de Manuel Bandeira, o Gato lia com interesse poemas de outros expoentes do Modernismo brasileiro, como Cecília Meirelles e Vinícius de Moraes.

Com o Trem de Ferro, Gato Pintado nos levava para uma viagem ao mundo das letras a bordo de uma simpática locomotiva animada.


Enquanto isso, Cecília Meirelles nos convidava a brincar com muita água e sabão em “Bolhas”.


A poetisa também nos levou a um papo com o eco.


E Vinícius de Moraes, que fez de uma simples porta uma passagem para um mundo encantado?

O poeta também nos divertiu ao narrar a saga de uma simpática… galinha!


Ainda sobre Vinícius de Moraes: nos lembrou que o tempo… ah, o tempo. É um implacável e inevitável. Ou não?

Gato Pintado (que nem pintado era… o felino era laranja!) também nos apresentou Mário Quintana, Arnaldo Antunes, Paulo Leminski e Ferreira Gullar. Ah, Gato Pintado, aquele gato danado!

Eu e meu amigo Gato Pintado. Sim, eu já visitei a maravilhosa biblioteca do Castelo!

André Santana é jornalista, escritor e produtor cultural. Mas também é um saudosista de carteirinha. Teve o caráter formado por programas da TV Cultura e ainda vai escrever um livro sobre isso. Enquanto isso não acontece, ele segue escrevendo críticas de TV nos sites Tele-Visão e Observatório da TV.

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